18 agosto 2011

A Raiz da História #2 - "Que dia vai alisar?”

“Até que, aos 19 anos de idade, enquanto chapava o cabelo, olhei para o espelho e vi a prisão em que eu me encontrava.”
Por:Cristine Mourão

Não muito diferente de muitos negros deste país, nasci e fui criada em uma família negra, onde todos, sem exceção, acham que são brancos do cabelo escorrido. Só acham, porque maioria, apesar de ter a pele “parda, carregam um nariz avantajado, lábios carnudos, e cabelos cacheados, embora sejam reprimidos pela chapa.

Eu, por sua vez, sou a mais preta da família. Entre todos os primos, que são muitos por sinal, sempre ganhei destaque por ter a pele mais escura dos demais. Destaque esse que, muitas vezes me fez chorar. Sofri, e ainda sofro dentro do meu próprio convívio familiar. “Olha lá a negra, essa puxou a quem?”, “E esse cabelo? Que dia vai alisar?”.

Os comentários absurdos sempre me acompanharam, e no intuito de parecer com as minhas primas e amigas da escola, minha mãe me levou ao salão de beleza pela primeira vez aos 7 anos de idade. A partir deste dia, as sessões de tortura tornavam-se mais freqüentes.


Os alisamentos, em vez de tornar meu pixaim liso, só acabavam cada vez mais com a minha auto estima, já que, os fios longos tornavam-se cada vez menores devido as quedas. Mas, mesmo com os cabelos quebradiços, opacos, com zilhões de pontas duplas e tudo que há de pior, comecei a ser conhecida como a “morena”, e não como “negra”. Estive presa a este padrão europeu durante muitos anos. Levava hooooras passando a maldita chapinha, gastava uma fortuna com cremes e alisamentos que nunca trouxeram a felicidade que sempre desejei.

Até que, aos 19 anos de idade, enquanto chapava o cabelo, olhei para o espelho e vi a prisão em que eu me encontrava. Senti vergonha de mim mesma, da minha família, das pessoas que diziam serem as minhas amigas. Senti vergonha até do meu país, que reprimi a mim e outros irmãos de cor há anos.

Foi quando molhei o cabelo novamente, e simplesmente cortei. Tirei tudo aquilo que, a partir daquele momento, me enojava: cortei o cabelo alisado. Deixei somente 16 centímetros de cabelo, mostrando um lindo Black Power.

A minha decisão causou muita risada aos demais, minha própria mãe me encoraja a passar a chapinha todo santo dia. As piadas tornaram-se mais intensas na minha família, continuo sendo a única negra na turma da faculdade, volta e meia, dedos são apontados para mim pelo o meu volume capilar, mas sinceramente, eu não me importo. Me acho bonita, gasto horas arrumando meu cabelo, mas com um prazer imenso.

O Black trouxe a identidade que sempre esteve perdida. Me sinto alguém no meio de tanta gente estúpida que por muito tempo tentou me derrubar. O orgulho negro que se apoderou de mim, rir daqueles que acham que minha cor e meu cabelo são motivos de piada. Hoje uso um Black absurdo de aaaaalto, e garanto: nunca me senti tão bem em toda a minha vida!

Cristine Mourão- 19 anos

#voceleu A Raiz da História
Bem, assim como tem em alguns blogs, aqui você vai pode conta a história do seu
cabelo. Contar todo o processo, seus medos, os resultados, o que ajudou . . .
Quer participar também?! Manda a história com fotos
pro e-mail:trancanago@gmail.com No assunto: A Raiz da História.