30 abril 2011

Preconceito às avessas

Um pezinho na sala.
Por: Fernanda Moraes



Entre os zilhões de textos que eu leio sobre preconceito, sobre a militância de mulheres negras, eu me peguei meio perdida, meio frustrada porque ninguém em nenhum desses textos falou da dificuldade de ser negra e não te aceitarem como tal.

"Mas como assim, Fernanda?!"

Se nós procurarmos sobre preconceito racial, tem uma penca de gente falando que não é aceito no trabalho, na escola, que é confundido com "mulata gostosa", enfim... E aí, eu aqui na frente do meu pc fico indagando: onde essas pessoas andam? Que lugares elas freqüentam? É uma realidade muito diferente da minha.

Não quero dizer que nunca fui discriminada, pelo contrário, eu sou e muito, mas ninguém nunca me negou um trabalho por eu ser negra, aliás, a maioria dos não-negros (e muitos negros) não me consideram negra( e olha que eu sou uma preta de respeito!).

Vou explicar bem direitinho para que não haja dúvida: Eu sou Fernanda Moraes, negra, estou no último semestre de jornalismo, moro numa região onde o preconceito racial e social berra. Estudam na mesma faculdade que eu pessoas desse tipo >aqui<! E eu volto afirmar: ninguém nunca me olhou feio por eu ser negra.

"Mas e o preconceito que você disse aí em cima?"

Eu escuto quase que diariamente coisas do tipo:
"Ahhh,você não sabe o que é ser negro!"
"Que nariz lindo que você tem, nem parece preta!"
"Nossa, mas que sarará linda que você é."
"Ai você nem representa a raça, tem cor de burro quando foge!"
"A fulana é morena assim, da cor da Fernanda!"

E a coisa piora quando me perguntam: "quem é negro na sua casa?" Ai eu fico com uma cara de *#% e dá vontade de responder: TODO MUNDO! Mas eu não posso, até porque não é 100% verdade.



O que eu faço com uma pessoa - negra - que me diz que eu não represento a raça? E quando falam que eu sou morena? Morena é a mãe, né? Com todo respeito! Eu fico triste e revoltada com todo esse preconceito que nós, negros, sofremos, mas acho que tudo também é uma questão de postura, de comportamento, de saber se colocar.

Queria dar um ALÔ para os formadores de opinião negros, esses que falam de experiências com o preconceito, que falam sobre a militância, sobre o estereótipo, existe uma parcela enorme da raça negra que sofre com o preconceito ás avessas. Ainda não encontrei ninguém que falasse desse tipo de preconceito e quando eu chego em casa triste por não me considerarem negra, eu converso com a minha mãe, que também é negra e ela só me diz que são um bando de ignorantes, que eu sou tão negra quanto piche e conta as histórias do Rei de Ketu...

Uma certa vez na escola o professor de Biologia falava sobre algumas expressões preconceituosas e no meu grupo de amigas todas éramos negras e uma delas disse: "se nós temos um pezinho na cozinha, a Fernanda tem os dois na sala!"

E isso dói até hoje.

Por: Fernanda Moraes